Reza a lenda que uma pessoa foi ao posto de gasolina fazer a troca de óleo do motor e pediu por uma marca específica do lubrificante: “710”. Ora, não havia tal marca, nem qualquer frentista jamais havia ouvido falar dela. Mas o cliente insistia, dizendo que somente utilizava aquele óleo, que era o melhor para seu carro, etc. Depois de muitas idas e vindas, finalmente se descobriu a causa do equívoco. Estampado, no fundo da lata, estava a palavra OIL, óleo em inglês.
Esta estorinha, muito utilizada em cursos de Comunicação, coloca em evidência o caráter simbólico da linguagem, destacando como a subjetividade é fundamental para a interpretação correta (ou não) de uma mensagem. Felizmente, toda linguagem possui suas convenções; tivessem utilizado uma fonte com serifas (aquelas pontinhas nas extremidades dos caracteres) e “cortado” o algarismo sete, a ambiguidade seria reduzida e não haveria tal confusão.
A linguagem acadêmica não é diferente e possui toda uma série de convenções que podem parecer enigmáticas aos não iniciados. Uma delas, o “apud”, não é o nome de um autor turco, mas sim a forma de proporcionar os devidos créditos de autoria, numa citação da citação. E outra convenção, também utilizada numa chamada de referência bibliográfica é a expressão “et al.”
Mas o que ela significa? As aulas e os livros de metodologia científica nos esclarecem, evitando confusões como a do posto de gasolina: et al. deve ser lido como “e outros”, sendo uma abreviação do latim et alii ouet alia.
E por que substituir o nome de alguém, que merece todo o crédito e reconhecimento por uma expressão destas? A ideia é simples: quando há muito autores de uma mesma obra, tanto a chamada da referência, quanto a referência em si ficariam “poluídas” com uma longa lista de nomes, tendo como resultado uma legibilidade prejudicada.
Este limite para este excesso de informação, entretanto, é variável, mudando de acordo com as normas de escrita acadêmica. Mas como princípio básico, basta imaginar como ficaria uma chamada de referência bibliográfica com seis autores para perceber a necessidade deste recurso. Em campos do conhecimento onde pesquisas colaborativas são realizadas e os artigos científicos possuem mais de cem autores, então, nem se fala.
Agora, como em qualquer idioma, uma coisa é compreender, outra é se expressar. Dessa forma, ainda que saibamos “ler” corretamente a expressão et al. em um texto acadêmico, utilizá-la corretamente é estória completamente diferente. São normas e detalhes que precisam ser dominados e que dão esta fama de chata e difícil à metodologia científica.
Então, para que você não se perca na multidão de autores do et al., vamos conhecer sua utilização.
1. Siga a norma, seja ela qual for
Quando falamos em metodologia, sempre precisamos responder à pergunta inicial: quem está mandando? Com isto me refiro a que norma específica está orientando a elaboração de seu texto acadêmico, seja um artigo científico ou um relatório de pesquisa, como uma monografia, dissertação ou tese. No Brasil, a norma mais comum para a apresentação de documentos científicos e técnicos é a ABNT; porém, algumas áreas do conhecimento aderem, por tradição histórica e comodidade, a normas internacionais. E logo, é relativamente comum que instituições de ensino e pesquisa possuam seus próprios manuais metodológicos, preenchendo alguns vazios das normas oficiais.
2. Aplique a regra
Dito isso, um fato chamativo: a atual versão da NBR 10520: 2002, que normatiza a elaboração das chamadas de referência bibliográfica não faz mais referência ao et al. Isso significa, em teoria, que você não está obrigado a utilizar esta convenção. Mas versões anteriores, a tradição e os manuais institucionais de formatação de trabalhos acadêmicos apontam para sua utilização.
Onde encontramos sim o et al. na NBR 6023:2002, aquela que especifica como elaborar as referências bibliográficas propriamente ditas. Ora, se na lista de referências é preciso suprimir o nome dos autores a partir de um certo número, nas chamadas de referência no corpo do texto, também seria necessário. Questão de lógica.
De qualquer forma, o limite que a ABNT coloca é o de três autores. Quando um trabalho possui quatro autores ou mais, a expressão entra em cena. Nesse caso, somente ficaria o nome do primeiro autor, seguido do et al. Os autores “sobrantes”, por assim dizer, desaparecem.
Contudo, existe uma exceção à regra, também encontrada na norma 6023, a de “casos específicos (projetos de pesquisa científica, indicação de produção científica em relatórios para órgãos de financiamento etc.), nos quais a menção dos nomes for indispensável para certificar a autoria, é facultado indicar todos os nomes”.
Já em normas internacionais, os manuais de estilo da APA (American Psychological Association) e da AMA (American Medical Association) exigem o uso do et al. para trabalhos com mais de seis autores. Por sua vez, a norma da MLA (Modern Language Association) é similar a ABNT, tendo como limite três autores e usando o et al para quatro autores ou mais.
Fica mais fácil compreender vendo a regra em funcionamento:
um autor: (MIRO, 2015)
dois autores: (MIRO; BIRO 2015)
três autores: (MIRO; BIRO; VALDOMIRO; 2015)
quatro ou mais autores, segundo a ABNT: (MIRO et al., 2015)
Neste exemplo, vemos a regra sendo aplicada à chamada da referência bibliográfica. Na referência bibliográfica em si o sobrenome e nome dos coautores também são suprimidos:
MIRO, José et al. Um framework transicional de comparadores de strings em modelos orientados a objetos: uma experiência em curso de especialização, Computação Paralela, Recife, v. 2, n. 1, jan. 2015.
Mais uma observação: neste exemplo também estamos seguindo a norma da ABNT, separando autores com o ponto e vírgula “;”. Mas mesmo no Brasil, revistas e eventos científicos adotam outras formas, por exemplo com o “e” ou o “&”. Sem falar nas normas internacionais!
3. Preste atenção para os detalhes
Agora que sabemos que a utilização do et al. é simples, vamos à s minúcias:
A norma da ABNT permite exceções, nas ocasiões nas quais seja indispensável certificar a autoria, quando todos nomes devem ser indicados. Estes casos específicos são “projetos de pesquisa científica, indicação de produção científica em relatórios para órgãos de financiamento, etc.”.
Atenção para a pontuação: somente o segundo termo da expressão em latim é abreviado e, portanto, é seguido de ponto. Já o “et” não tem ponto depois. No sistema autor-data, será utilizado a vírgula para separar a expressão et al. do ano de publicação, por dois motivos: o primeiro a própria lógica deste sistema e logo pelo fato do al. ser uma abreviação, possibilitando o uso da vírgula. Observe como a expressão foi grafada ao longo de todo este post.
Podemos encontrar em manuais de normalização acadêmica a recomendação de não aplicar o itálico na expressão et al. A origem desta regra está numa norma que foi cancelada pela ABNT, a NBR 10522 de 1998 ”“ Abreviação na descrição bibliográfica ”“ Procedimentos. Contudo, a prática e o uso recomendam que você utilize fonte normal.
Fotografia: Misha Gordin