Pense numa profissão na qual o povo discute! E ainda bem que é assim, pois se todos concordam, a ciência já não é mais ciência, é dogma.
Mas possivelmente, existe um ponto sobre o qual pesquisadores em geral e professores universitários concordam. Em unanimidade. Unidos em comunhão universal, apesar de todas as rusgas e disputas, intelectuais ou não, que caracterizam a vida acadêmica.
Este ponto é o preenchimento do currículo Lattes. Tarefa absolutamente tenebrosa para muitos, minimamente chata, tediosa, trabalhosa.
Para aliviar um pouco, existe uma funcionalidade, quase desconhecida, a chamada importação da produção.
A ideia é simples: imagine que você publicou um trabalho junto com dois outros participantes de seu grupo de pesquisa. Agora que o artigo finalmente “saiu” é hora de atualizar o Lattes, para que esta sua produção esteja em seu currículo e passe a contar para os inúmeros processos pelos quais somos avaliados.
Enquanto você faz isso, seus dois colegas também estão fazendo a mesmíssima coisa, fazendo o que em administração se chama “retrabalho”. Uma forma suave de dizer: perder tempo, gastar dinheiro, ser improdutivo.
Não seria ótimo que eles pudessem simplesmente copiar de seu currículo para os deles? Pois saiba que isto é possível!
Importando a produção, passo a passo
Para importar uma produção em comum do currículo Lattes de um colaborador, por própria definição, é necessário que duas pessoas ajam separadamente.
O exportador
Esse é o mais generoso, digamos, da dupla ou grupo de colaboradores. Foi ele que teve o trabalho de atualizar seu próprio Lattes, entrando todas as informações de um artigo.
Pode ser um orientador prestativo. Pode ser o orientando que faz o “trabalho sujo”. Pode ser alguém que incorporou a rotina de atualizar o currículo a ponto de beirar a compulsão.
Não importa. Para exercer seu espírito altruísta o exportador precisa realizar duas ações:
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Deixar que seus colaboradores importem sua produção.
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Identificar estes mesmos colaboradores na base de dados do Lattes. Utilizando a terminologia das redes sociais, ele precisa “marcar” seus amigos.
Vamos ver o passo a passo de como fazer isto.
1. Na barra de ferramentas, no lado esquerdo da tela, clique no ícone “Autores citados no currículo”
2. Localize o nome de seu colaborador no “dicionário de autores”. Clique sobre o nome.
3. Uma nova janela irá abrir, com detalhes de seu coautor. Marque a caixinha “Autorizo este autor a importar produções do meu currículo Lattes”.
4. Uma caixa de avisos irá aparecer, informando que é preciso identificar o autor na base do Lattes, para que ele possa importar. Clique “Ok”, para prosseguir. Se quiser cancelar a operação, rá, adivinhou, clique em “Cancelar”.
5. A janela agora tem uma lista de autores prováveis, isto é, automaticamente identificados pelo sistema. Caso não apareça, há uma caixa de buscas, para refinar sua procura.
6. Clique sobre o nome da pessoa, para autorizar. Dica: para verificar se é este mesmo, clique sobre o nome e uma nova janela se abrirá em seu navegador, com o currículo dele.
7. Uma janelinha surgirá do nada, informando sobre o sucesso da operação. Em alguns segundos ela desaparece e você irá voltar à tela do dicionário de autores.
Perceba o detalhe: ao lado do nome do autor agora aparece um ícone com o logotipo do Lattes. Clicando sobre este ícone, você será levado ao currículo de seu colega.
Observação: é sempre interessante e recomendável autorizar as pessoas com quem você colabora a importar sua produção; já, já, veremos o por quê.
Pronto! Agora que um colaborador está identificado e autorizado, ele poderá importar a produção. Para ser ainda mais prestativo, o exportador pode avisar, por seu canal de comunicação preferido, esta possibilidade.
Mas atenção! Depois de enviar o currículo para o CNPq, leva um tempinho para a base ser atualizada. Dizem que no máximo 48 horas, mas em geral, em 15 minutos a alteração já está lá.
Note também outra mudança: agora o nome de seu coautor aparece em seu currículo em cor azul, como um link. Clicando sobre ele, a mesma coisa, você será levado ao currículo Lattes de seu colaborador.
O que o Lattes une, ninguém separa!
O importador
Naturalmente poderia falar no plural, “os importadores”, pois cada vez mais vemos artigos coletivos, elaborados por grupos de pesquisa. Mas para simplificar e evitar aqueles parênteses depois de cada palavra, é melhor ficar no singular mesmo.
Seja um, sejam muitos, quem for importar a produção de um colega para reduzir seu trabalho de atualizar o Lattes, precisa seguir estes passos.
1. Na barra de ferramentas, clique sobre o ícone da função “Importar produção”.
2. Uma nova janela se abre, com uma lista de autores do Lattes que lhe marcaram em publicações. Caso tenha dúvida de quem seja, o ícone com o logotipo do Lattes está ali. Você já sabe para o que ele serve, não é?
3. Clique sobre o nome desta pessoa. Agora aparece uma lista com as produções que podem ser importadas. Preste atenção na legenda. Itens com sinal verde ainda não estão constam de seu currículo. Sinal amarelo, atenção! A produção pode estar, dou pode não estar. Por algum detalhe nas informações, o sistema não conseguiu se decidir a respeito e você precisa decidir por ele. Sinal vermelho, pare, a produção já consta de seu currículo e não deve ser importada.
4. Marque a caixinha da produção que você quer importar e clique em “Salvar”.
5. Se tudo der certo, aparece uma caixinha informando sobre o sucesso da operação.
6. Envie o currículo para o CNPq, para que a produção seja realmente incorporada a seu currículo.
3 motivos para permitir a importação de sua produção
Evitar trabalho, e ainda mais um trabalho que é visto como burocrático e chato, tem seu próprio apelo.
Porém, a função de importação da produção de coautores possui outras motivações. Vejamos quais são.
1. Pesquisadores devem pesquisar
Lógico que como em quase qualquer outra profissão, as tarefas burocráticas são inevitáveis. Mas se elas puderem ser facilitadas, melhor.
2. A tecnologia de informação é para isso mesmo
Em termos técnicos, o currículo Lattes é construído em dados estruturados, justamente para que toda informação que você, eu, nós introduzimos ao preenchê-lo possa fazer algum sentido.
Neste ponto, o intercâmbio destes dados é um dos grandes trunfos do Lattes, ao permitir que sistemas de informação diferentes “conversem” entre si. Como exemplo, a Capes coleta automaticamente os dados de produção dos pesquisadores de uma pós-graduação a partir do Lattes. Muitas universidades também têm feito o mesmo em relação as diversas atividades de seus professores.
Não tem sentido repetir o trabalho, digitando todas as informações de novo ou, na melhor das hipóteses, “copiando e colando”.
3. As redes de colaboração tornam-se visíveis
Como num Facebook acadêmico, ao associar um outro pesquisador com o “perfil real” dele no Lattes (por assim dizer), estamos acrescentando ainda mais estrutura aos dados. Agora, a partir desta imensa base de dados, é possível saber quem publica com quem, quem trabalha com quem, etc.
Como a a palavra de ordem nos dias de hoje no mundo da ciência é a colaboração, estes dados serão muito úteis para os organismos de gestão. E você também pode ver sua própria rede de colaboração, através do menu que se abre logo após você buscar o currículo de alguém na base Lattes.
Limitações da importação Lattes
Tudo muito bonito e uma excelente ideia, como já vimos.
Mas parece que sempre tem um “porém””¦
No caso, a importação funciona bem, bem mesmo. No teste que fiz, depois de alguns minutos que minha coautora e colaboradora de pesquisa tinha me marcado, a entrada estava disponível em minha lista de importação. Mais um clique e pronto, o artigo já estava em meu currículo.
E aqui está a limitação: no momento em que escrevo, só é possível importar artigos completos publicados em periódicos. Tudo bem que este tipo de produção científica é uma, se não a mais, valiosa de todas no jogo da publicação acadêmica.
Todavia, não é a mais comum. Trabalhos apresentados e publicados em anais de congressos, participação em bancas, em projetos de pesquisa, etc. São elas que fazem o dia a dia do pesquisador, mas que não podem ser importadas. Algumas produções coletivas, como por exemplo as bancas são inclusive muito mais trabalhosas, pois possuem mais informações a serem adicionadas.
Ou seja, a importação ajuda, pero no mucho.
Por útil que seria ter esta facilidade à disposição, não há nenhuma informação sobre quando, e se, a importação dos outros tipos de produção vão estar disponíveis.
Um incentivo ao comportamento antiético?
Vou antecipar aqui um tipo de comentário que certamente irá surgir: ao facilitar a trabalhosa e entediante tarefa que é atualizar o Lattes, a importação de dados de produção incentiva a coautoria, principalmente os chamados “bancos de autores”.
Do que se trata? Na busca por uma maior produtividade (ou produtivismo) e do consequente reconhecimento, uma estratégia cada vez mais utilizada é publicar junto com outros autores, mesmo não tendo participado da pesquisa. Dessa forma, três pesquisadores que sejam amigos e tenham confiança entre si podem multiplicar por três suas respectivas produções.
Um banco de autores não é uma fraude científica, mas é considerado um comportamento antiético (saiba mais sobre a diferença em meu artigo sobre ética na produção científica). Por este motivo, talvez muitos argumentem que facilitar a coautoria irá incentivar ainda mais este tipo de ação.
Acredito que este pensamento é um determinismo tecnológico, isto é, atribui à tecnologia a responsabilidade por qualquer mudança, seja ela para o bem, ou para o mal.
E basicamente é atribuir uma responsabilidade à tecnologia que não lhe pertence. Se pesquisadores no mundo todo estão recorrendo a este estratagema, o motivo não são as facilidades da tecnologia, mas sim um sistema de recompensas e de punições que utiliza como critério principal a quantidade de ciência que alguém é capaz de realizar.
Portanto, agora é esperar que o CNPq amplie as funções de importação para que a vida de pesquisador se torne um pouquinho, somente um pouquinho, mais fácil e mais produtiva.