Marcelo Sabbatini

“Não vou chamar duas vezes!’: a sabedoria das mães e a escrita acadêmica

“Não vou chamar duas vezes!”: aplicando a sabedoria das mães à  escrita acadêmicaCerteza que todos nós já ouvimos a frase. Seja para ir à  mesa, almoçar ou jantar, ou para realizar alguma trabalho doméstico, ou para qualquer outra situação, crianças e jovens nunca parecem atender de primeira. E então escutamos esse alerta tão conhecido.

Certo, e o que isso tem a ver com a escrita acadêmica?

Basicamente estive pensando nisso ao encontrar com bastante frequência nos últimos dias, revisando os capítulos de um livro elaborado junto com os alunos da pós-graduação, algo que considero ser um erro: fazer a chamada de uma referência bibliográfica duas vezes.

Mas antes de justificar o por quê de ser um erro e como evitá-lo, talvez seja mais interessante mostrar do que se trata. E para isto, vamos tomar um exemplo (modificado) de um texto meu (merchan: ebook no qual abordo os Fundamentos da Educação na Educação a Distância).

Exemplificando

Esse tipo de “absurdo” ou “assombro” para Romão (2008), não resultaria numa inclusão efetiva, indviabilizando mesmo o acesso à  educação, relegando ao próprio indivíduo a responsabilidade por sua formação mais elementar. Já Barreto (2008) afirma:

Sem negar o acesso aos diferentes produtos do trabalho humano, as TIC obviamente incluídas, como condição necessária a qualquer proposta democrática, é preciso reconhecer que o acesso em si não é suficiente. A apropriação, como horizonte, requer o reconhecimento de fronteira mais complexa, colocando de um lado os que podem até mesmo modificar as aplicações da tecnologia e, de outro, os consumidores de pacotes, limitados a operações tão simples quanto previsíveis (BARRETO, 2008, p. 931).

Percebem qual o problema? A chamada da referência bibliográfica, no caso no formato autor-data está sendo repetida. Primeiro com o autor evidenciado na frase e, logo, ao final da citação direta longa (aquelas com mais de quatro linhas).

Por que essa prática é errada na escrita acadêmica?

Tenho alguns argumentos:

Como evitar a “dupla chamada”

Agora, se minha argumentação em relação aos inconvenientes desta chamada dupla da referência bibliográfica foram convincentes, como evitá-la? A resposta é bastante simples, basta não fazer! E para isto, só é preciso utilizar um elemento de ligação que não seja o uso do “de acordo”, “para”, “conforme”, etc., seguido do nome do autor e da data de publicação entre parênteses. Em algumas ocasiões, um simples “Assim” seria suficiente, conforme a correção do exemplo:

Esse tipo de “absurdo” ou “assombro” para Romão (2008), não resultaria numa inclusão efetiva, inviabilizando mesmo o acesso à  educação, relegando ao próprio indivíduo a responsabilidade por sua formação mais elementar. Assim:

Sem negar o acesso aos diferentes produtos do trabalho humano, as TIC obviamente incluídas, como condição necessária a qualquer proposta democrática, é preciso reconhecer que o acesso em si não é suficiente. A apropriação, como horizonte, requer o reconhecimento de fronteira mais complexa, colocando de um lado os que podem até mesmo modificar as aplicações da tecnologia e, de outro, os consumidores de pacotes, limitados a operações tão simples quanto previsíveis  (BARRETO, 2008, p. 931).

Porém, mais correto ainda do ponto de vista de coesão textual seria realmente “emendar” as ideias. Para isso, uma saída é parafrasear o início daquela que vai ser a citação direta longa. Pode ser a primeira frase, ou até um trecho mais longo. Vejamos:

Esse tipo de “absurdo” ou “assombro” para Romão (2008), não resultaria numa inclusão efetiva, inviabilizando mesmo o acesso à  educação, relegando ao próprio indivíduo a responsabilidade por sua formação mais elementar. Mesmo considerando a importância das TIC para a vivência social e democrática, a questão do “acesso” não é suficiente:

A apropriação, como horizonte, requer o reconhecimento de fronteira mais complexa, colocando de um lado os que podem até mesmo modificar as aplicações da tecnologia e, de outro, os consumidores de pacotes, limitados a operações tão simples quanto previsíveis (BARRETO, 2008, p. 931).

Concluindo, não somente é desnecessário, mas é equivocado chamar o autor e sua obra duas vezes. E nisso nossas mães (mãe-avó, mãe-pai, mãe-tia, todos tipos de mãe) tinham razão.

 

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